sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Paulo Pedrosa, da Abrace: por uma energia mais barata

Entidade participa do Enase 2010 - 7° Encontro Nacional de Agentes do Setor Elétrico, nos dias 29 e 30 de setembro, no Rio de Janeiro

Uma das preocupações dos consumidores de energia, que são cada vez mais cresentes, é com o aumento da transparência e com a competitividade no setor elétrico. Isso porque, soluções que são tomadas pelo governo implicam em repasse de custos exatamente para quem consome energia - e no caso de indústrias, por exemplo, uma elevação dos custos implica diretamente no aumento dos custos de produção. Na avaliação da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres, o processo de aumento da eficiência, da transparência e da competitividade é fundamental para que o país deixe de perder oportunidades de desenvolvimento econômico.

"Os últimos oito anos foram marcados por uma grande preocupação em torno da segurança do abastecimento, porque o “fantasma” do racionamento sempre esteve presente. O setor de energia deveria estar voltado ao atendimento de seus consumidores", afirma Paulo Pedrosa, presidente executivo da Abrace. A entidade é uma das signatárias da Carta "Energia para o Futuro", que será apresentada por 11 associações do setor elétrico. Ao mesmo tempo, encaminhou aos candidatos à Presidência da República a “Agenda de Política Energética – 2011 – 2014”, em que propõe sugestões para redução de custos da energia

Essas e outras questões do segmento serão debatidas pela Abdib durante o Enase 2010 - 7º Encontro Nacional dos Agentes do Setor Elétrico, que acontecerá entre os dias 29 e 30 de setembro no Hotel Sofitel, no Rio de Janeiro, e terá como tema central "O Futuro da Política Energética". O Enase é promovido pelo Grupo CanalEnergia, em parceria com a ABCE (concessionárias), Abdib (Indústria de Base), Abiape (autoprodutores), Abrace (consumidores), Abraceel (comercializadores), Abrage (geradores), Abragef (geração flexível), Abraget (geradoras termelétricas), Abrate (transmissoras), Anace (grandes consumidores), Apine (produtores independentes), APMPE (pequenos e médios produtores), ABCM (carvão mineral), ABEEólica (energia eólica), Abdan (nuclear) e Cogen (coegeração). Leia abaixo a entrevista com Paulo Godoy:

Agência CanalEnergia - O Enase 2010 terá como tema central "O futuro da política energética". Qual a expectativa do setor elétrico para os próximos anos na visão dos consumidores?


Paulo Pedrosa - Os últimos oito anos foram marcados por uma grande preocupação em torno da segurança do abastecimento, porque o “fantasma” do racionamento sempre esteve presente. A perspectiva é que, nos próximos anos, tenhamos um novo ciclo no setor, em que se somem, cada vez mais, a essa preocupação com segurança questões relativas ao aumento da transparência, da eficiência e da competitividade no setor de energia, favorecendo a redução dos custos para os consumidores. Esse processo é fundamental para que o país deixe de perder oportunidades de desenvolvimento econômico e maior inserção no mercado global em função do alto custo da energia disponível para suas empresas.

Agência CanalEnergia - Dos pontos que a Abrace apresentará no Enase, quais que merecem maior atenção? Por quê?


Paulo Pedrosa - O setor de energia deveria estar voltado ao atendimento de seus consumidores. Hoje os interesses dos agentes do setor, investidores e fornecedores tem um peso proporcionalmente maior. O formato atual gera ineficiências e falta de competição no setor, cujas conseqüências são condições pouco favoráveis aos consumidores, principalmente no que se refere a custos e liberdade na contratação. Falta transparência nas decisões que lhes afetam. Muitas vezes, por exemplo, as regras atendem a determinados interesses e reduzem riscos dos agentes de geração, transmissão e distribuição, sem a correspondente contrapartida na redução do custo do atendimento aos consumidores. A solução tradicional é a de repassar custos aos consumidores, sejam eles de políticas públicas que deveriam ser assumidas pelos contribuintes seja riscos que seriam melhor alocados aos agentes do setor. Também há problemas no que se refere à falta de sinergia na comercialização de gás natural e de energia elétrica e a falta de liquidez na contratação e mercados secundários para estas commodities energéticas.

Agência CanalEnergia - Quais as questões devem continuar sendo debatidas em relação a encargos e tributos do setor?


Paulo Pedrosa - Já há, no setor elétrico, uma convergência absoluta sobre o mal que os encargos e tributos fazem. Infelizmente, essa convergência não tem sido suficiente para reverter a tendência de crescimento. Um pouco talvez porque a grande massa de consumidores, os de baixa tensão, ainda desconheça essa realidade e não se mobilize. É um tema que precisaria estar mais inserido na agenda política do país. Hoje o cidadão já enxerga (e questiona) os elevados tributos que paga sobre a maioria dos produtos, mas não do setor elétrico. Para reverter esse quadro, também é necessário aumentar a transparência na cobrança e definição dos encargos e tributos. O setor precisa também de uma espécie de estudo de impacto econômico, que identifique quem paga os custos que tornam nossa energia uma das mais caras do mundo e também quem são os beneficiários por tudo o que é pago. Este estudo seria um bom começo para atacar as distorções.

Agência CanalEnergia - Que soluções a Abrace estuda para reduzir os custos com energia?

Paulo Pedrosa - A Abrace preparou para apoiar os programas de governo dos candidatos à Presidência da República a “Agenda de Política Energética – 2011 – 2014”. Entre as principais sugestões da agenda estão:

1. Energia elétricaReversão das distorções dos encargos setoriais - A proposta da Abrace é que o governo proíba a criação de novos encargos setoriais e vete as propostas de postergação da validade de encargos existentes, bem como impeça o uso das tarifas de energia como fonte de financiamento de programas cujos custos deveriam ser pagos pelo Tesouro Nacional. Além disso, é preciso eliminar das contas de luz os encargos setoriais que não têm relação direta com a geração, transmissão e distribuição de energia, bem como o financiamento de subsídios cruzados explícitos (fontes incentivadas, aquicultura e irrigação, Luz Para Todos e baixa renda) e subsídios cruzados implícitos (descontos compulsórios a consumidores rurais e empresas concessionárias de água, esgoto e saneamento), entre outros pontos.

2. Energia elétricaOferta e segurança de suprimento - A Abrace defende que o destino das concessões de geração anteriores a 11 de dezembro de 2003 seja decidido de forma célere e onerosa, de modo a favorecer a modicidade tarifária. Os valores pagos pelas concessionárias devem ser usados para abatimento da Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (Tust) e do Encargo de Serviços do Sistema (ESS). É preciso também priorizar a expansão do parque gerador por meio da construção de hidrelétricas, elevando ao máximo possível a capacidade de regularização dos reservatórios. Este aspecto pode ser beneficiado pelo mapeamento e demarcação legal das reservas potenciais de aproveitamentos hidrelétricos. Nesse tópico, também é preciso garantir ao consumidor livre o direito de comercializar excedentes contratuais, além de rever métodos e processos de gestão pública na aplicação da legislação ambiental brasileira, com foco na redução de prazos de exame de pleitos de licenciamento.

3. Energia elétrica – Tributação - A Abrace recomenda que seja feita uma avaliação dos efeitos da diversidade de alíquotas do ICMS na competitividade nacional. É preciso também eliminar distorções, incluindo a aplicação da sistemática de “cálculo por dentro” do ICMS (que, na prática, faz com que a alíquota seja superior à inicialmente definida), bem como o valor da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) da base de cálculo do ICMS. Por fim, é necessário desonerar os investimentos em geração de energia elétrica.

4. Energia elétrica – Inovações - Regulamentar a implantação dos polos industriais de compartilhamento de infraestrutura e aquisição de insumos. É preciso definir o tratamento a ser dado à compra de energia elétrica e à contratação do uso e da conexão aos sistemas elétricos por grupos de indústrias instalados na mesma área.

5. Gás natural - É urgente a regulamentação da Lei do Gás e a definição das normas complementares e instruções necessárias à sua efetiva implementação. A Abrace recomenda ainda a implantação de uma política nacional para o gás natural que priorize o aumento da sua competitividade e a instituição de um planejamento integrado dos setores elétrico e de gás natural.

6. Eficiência e transparência do setor - A agenda traça recomendações em favor do aumento da eficiência e da transparência do setor no que se refere à operação e ao planejamento do sistema elétrico e do fornecimento do gás natural, aumentando a eficiência do uso dos recursos, e em relação às políticas incorporadas ao custo final da energia. Também é preciso institucionalizar mecanismos que permitam a efetiva transparência e participação dos consumidores nas decisões cujos custos lhes serão atribuídos.

Agência CanalEnergia - O que a Abrace chama de "pressões competitivas"? Quais os reflexos para os consumidores?

Paulo Pedrosa - Pressões competitivas são as forças que fazem com que as empresas em geral estejam constantemente se esforçando para melhorar o atendimento e a qualidade dos produtos e serviços fornecidos a seus consumidores. A concorrência é a principal guia desse processo. O setor elétrico tem sido protegido dessas pressões, com reflexos óbvios sobre a situação dos consumidores. No caso da energia, os consumidores ficam alijados do processo que lhes garante, em todas as outras áreas, reduções de preços e aumento de qualidade graças a esforços constantes das indústrias fornecedoras.

Agência CanalEnergia - Como está o andamento da MP 487 e o que a Abrace tem discutido sobre este tema?


Paulo Pedrosa - Felizmente essa MP caiu porque o Congresso Nacional não teve a agilidade necessária para aprová-la. De qualquer forma, esse é um exemplo de como regras que afetam o setor de energia podem ser  alteradas com pouca discussão e de forma pouco transparente, por meio de MPs que nem estão relacionadas, em princípio, com o setor elétrico (como era o caso dessa medida).


Fonte: Canal Energia
Autor: Danilo Oliveira