Setor vai propor a criação de um mecanismo de realocação de energia (MRE) conjunto entre as fontes, o que pode alavancar usinas a vento no mercado livre
Por Luciano Costa, de São Paulo
O setor eólico pretende reduzir uma das principais características associadas à fonte: a incerteza quanto à geração de energia. Com isso, seria possível alavancar as negociações para viabilizar usinas no mercado livre, fazendo com que os investidores não fiquem apenas com a opção de participar dos leilões promovidos pelo governo.
Para tanto, uma solução encontrada por especialistas é a criação de algo nos moldes do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE), utilizado hoje por hidrelétricas. Mas o sistema não reuniria apenas os parques movidos a vento, mas também as hidrelétricas.
Por meio do MRE existente, é possível administrar os riscos hidrológicos e assegurar que todas hidrelétricas recebam receita por sua garantia física, independemente de suas reais produções de energia. O importante é que a produção do MRE como um todo não fique abaixo do total de garantia física do sistema. A ideia dos empreendedores eólicos é criar um sistema semelhante para a fonte aproveitando a complementaridade com a geração hídrica. Assim, no caso de uma eólica produzir menos, poderia ser compensada por uma hidrelétrica, e vice-versa.
A proposta de um MRE misto aparece em um estudo elaborado pela Engenho Consultoria a pedido da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica). De acordo com a diretora-executiva da empresa, Leontina Pinto, o documento, já em posse da entidade eólica, aponta que o mecanismo “é viável e bom para todo mundo”.
“O que a gente viu foi que os anos de racionamento foram anos de bons ventos. Quando houve falta d´água no Sudeste, o Nordeste teria ajudado bastante (com eólicas). Teve uma complementaridade interessante do vento com a água”, explica a diretora. Segundo Leontina, a combinação das fontes poderia também reduzir a necessidade de despachos de termelétricas.
O levantamento feito pela Engenho abordou ainda diversos outros aspectos ligados à comercialização de energia eólica no mercado livre. ”(Tratou de) oportunidades, preços, regulação. E a joia da coroa, que é mesmo o MRE”, resume a executiva. Para Leontina, a ideia de associar hídricas e vento apareceu porque, sozinhas, as eólicas não apresentam complementaridade.
“Um MRE de eólica com eólica seria uma catástrofe. Eólica e solar andam juntas também. Todas renováveis são complementares com a hidrelétrica”, analisa Leontina.
Opinião semelhante tem o diretor da Abeeólica, Otávio Silveira. “Faz todo sentido fazer um MRE com as duas fontes. O somatório das hídricas e das eólicas pode ser melhor para os dois. Faz muito mais sentido do que um MRE eólico, em que você vai somar banana com banana e pode não haver complementaridade”, exemplifica.
O vice-presidente da Abeeólica, Lauro Fiúza, também vê chance para integrar projetos eólicos e solares nos mesmos sítios. Segundo ele, seria possível ganhar em complementaridade e em redução de custos. Uma das vantagens é o fato de que as placas fotovoltaicas seriam instaladas nas usinas e compartilhariam o mesmo sistema de transmissão, por exemplo, barateando os empreendimentos.
O assunto já está sendo observado também pelo governo. O diretor de estudos de energia elétrica da Empresa de Pesquisa Energéitca (EPE), José Carlos de Miranda, diz que Apine e Abeeólica "têm feito análises e encaminhado à EPE e ao Ministério de Minas e Energia" e que o tema ainda está "nas primeiras discussões".
De acordo com o diretor, a decisão "é mais do MME", mas levará em conta informações passadas pela EPE e pela Aneel, além de, possivelmente, ir a consulta pública. "Tudo é feito com muita discussão para se achar o melhor para o setor".